A Amazônia é o lar do maior rio do mundo em volume de descarga e da mais extensa floresta tropical da Terra, que abriga a maior biodiversidade do planeta. Ela armazena enormes quantidades de carbono e sustenta a vida de milhões de pessoas. No entanto, até agora, as vastas florestas de mangue na foz do Rio Amazonas permaneceram inexploradas e pouco estudadas.
Os manguezais existem, no caso da costa brasileira, desde Santa Catarina até o Amapá, mas, quando se começa a chegar perto do Equador, esse bioma fundamental para o funcionamento de toda a vida marinha – várias espécies usam as áreas como berçário – muda completamente de fisionomia.
Para desvendar os mistérios desse ecossistema único, onde existem árvores de até 30 metros de altura e de um metro de diâmetro, o ecologista marinho e explorador Angelo Bernardino e sua colega Margaret Owuor, entre outros especialistas, embarcaram na Expedição Perpetual Planet à Amazônia da Rolex e da National Geographic.
A Iniciativa Rolex Perpetual Planet é um projeto que busca manter vivo o legado de Hans Wilsdorf, o próprio fundador da marca, apoiando indivíduos e organizações que lutam pela preservação do planeta. Nesse contexto, a Rolex vem apoiando, há quase um século, expedições para as mais variadas áreas do planeta. Mais recentemente, um total de sete equipes de cientistas e exploradores estudou a região da Amazônia. O projeto tem possibilitado o acesso a alguns dos confins da enorme bacia do Rio Amazonas, desde os picos glaciais dos Andes até o delta labiríntico, onde as águas fluviais encontram o Oceano Atlântico.
“O principal objetivo é entender o papel ecológico dos manguezais amazônicos e a importância deles para a população local”, comenta Bernardino, sobre sua parte da expedição. Ele é um dos protagonistas do estudo e tem revelado alguns dos achados da expedição, que teve início em abril de 2022. Um deles foi a identificação de uma floresta de mangue que cresce totalmente na água doce, fisionomia botânica raramente descrita na natureza. O manguezal costuma crescer em todo o mundo na confluência do mar com rios. Ou seja, em ambiente de água salobra. “Foi uma surpresa e tanto. Há muito mais coisas para descobrir nessa área. Podemos passar mais 20 anos na região e provavelmente ainda teríamos perguntas a responder”, admite.
Ele, que se apaixonou pelo oceano e pelos seus variados ecossistemas pela primeira vez quando era adolescente, durante uma viagem de mergulho com a família, acredita que, com o tempo, todos vão perceber a importância dos manguezais para a vida do planeta. “Pela primeira vez, fizemos a perfuração desse solo para entender a absorção de carbono por essas árvores. O resultado mostrou que elas podem armazenar duas vezes mais carbono por metro quadrado que a Floresta Amazônica. Também observamos a importância dos manguezais para remover poluentes aquáticos”, explica.
Contribuição para a ciência
No recorte específico dos estudos realizados nessa expedição, vários questionamentos se articularam na cabeça dos cientistas após os trabalhos de campo que duraram duas semanas. Além de quanto carbono essas florestas de mangue estavam armazenando, os pesquisadores estão buscando responder, durante a fase de análise dos dados, a perguntas como: que tipo de serviços ecossistêmicos elas fornecem à população local? E como é que as florestas podem enfrentar os desafios que vêm por aí, desde a elevação do nível do mar e as alterações na salinidade e na acidez dos oceanos até o aumento da urbanização e das práticas de pesca insustentáveis?
Como é praxe nos trabalhos da parceria entre Rolex e National Geographic, além do envolvimento científico e das conversas com os moradores locais, a tecnologia esteve presente. Thiago Silva, que também é explorador da National Geographic, foi quem ajudou o grupo a usar laser para construir mapas 3D detalhados das florestas, calculando o tamanho das árvores para descobrir a extensão do armazenamento de carbono. Ele também assumiu funções como os testes em amostras de solo e água e as fundamentais entrevistas com moradores da região.
Quem liderou essa parte comunitária da pesquisa foi Margaret Owuor. Por gerações, os habitantes da região dependeram das árvores para a pesca e a captura de caranguejos. Mais recentemente, os manguezais passaram a servir de barreira natural indispensável contra a subida e a crescente turbulência dos mares. “Cada vez que entrava numa floresta de mangue, imaginava como seria se toda ela fosse desmatada. O que seria dessas comunidades? Elas ficariam tão expostas! Esse ecossistema é importante não apenas para a pesca e por todos os alimentos obtidos por meio dessa atividade, mas também para sua própria sobrevivência”, afirma Owuor.
A conversa com as comunidades tradicionais que vivem na costa do Amapá revelou as contradições do cotidiano dessas pessoas. A equipe descobriu que, embora muitos residentes compreendessem profundamente o valor inerente das florestas de mangue, alguns, frustrados pelas condições básicas de vida e pela falta de serviços, esperavam vê-las desmatadas em favor do desenvolvimento urbano e de projetos de infraestrutura. Owuor, no entanto, não perde as esperanças. “Meu sonho é que um dia todos percebamos que este mundo é para todos nós e que precisamos realmente trabalhar juntos para protegê-lo – não só para nós, mas também para as gerações que estão por vir”, declara.
Os impactos das mudanças climáticas
Os primeiros projetos de pesquisa implementados pela Expedição Perpetual Planet à Amazônia da Rolex e da National Geographic já começaram a produzir resultados. Os exploradores Baker Perry e Tom Matthews instalaram a estação meteorológica mais alta dos Andes tropicais, com 6.349 metros, a apenas 35 metros do Pico Nevado Ausangate, no Peru. A montanha funciona como fonte de água para grande parte da Amazônia.
A estação tem fornecido, em tempo real, dados valiosos sobre os padrões climáticos do local, contribuindo para entender como as mudanças climáticas estão afetando a região e como as transformações na região podem afetar o clima global. “A Amazônia é uma das regiões mais importantes do planeta por influenciar a circulação atmosférica, principalmente da água. Isso evidencia o quão significativo é seu impacto nos ecossistemas, nas pessoas e nas geleiras, impacto este que não se restringe à América do Sul”, explica Perry.
Outros cientistas, em outras frentes, também estão obtendo resultados promissores. João Campos-Silva, laureado dos Prêmios Rolex de Empreendedorismo, e sua colega Andressa Scabin, exploradora da National Geographic, foram os primeiros a colocar um identificador com GPS em um pirarucu, o maior peixe de escamas de água doce do mundo. Fernando Trujillo, também um explorador da National Geographic, pesquisou 1.270 quilômetros de rios em quatro países, calculando que haja 1.366 dos icônicos botos-cor-de-rosa vivendo na região.
Além das diferentes atribuições, a equipe tem um perfil multidisciplinar e é formada por profissionais da ecologia, biologia, hidrologia, climatologia, geologia e geoquímica. E todo esse trabalho está sob constante vigilância do fotojornalismo de Thomas Peschak, que começou sua carreira como biólogo marinho. “Em vez de encontrar tubarões, baleias e tartarugas marinhas com as quais estou acostumado, vou conhecer anacondas, piranhas e preguiças”, comenta ele, que é um premiado fotógrafo da vida selvagem e explorador da National Geographic. Peschak está fazendo todo o registro da expedição, para que as descobertas científicas cheguem a um grupo cada vez maior de pessoas.
Com o apoio da Iniciativa Rolex Perpetual Planet, as equipes esperam unir seus conhecimentos e experiências em todos os seus diferentes campos de atuação, para desvendar os complexos ecossistemas interligados que mantêm viva a maior bacia de água doce do mundo. Os diferentes projetos, ao se interligarem, gerarão informações de qualidade para que a preservação da floresta tropical e, indiretamente, do planeta seja assegurada.
Fotos: Pablo Albarenga/National Geographic e Corey Robinson/National Geographic