Medidas elaboradas pela CBIC mostram ações que fortalecem práticas éticas na administração pública e ajudam a reduzir possibilidade de desvios no setor
Estabelecer medidas anticorrupção na fase inicial dos projetos é um dos caminhos para fortalecer processos éticos na relação entre o público e o privado. Mas como identificar os pontos sensíveis que podem levar a desvios de verba pública? A resposta pode vir do mapeamento elaborado pela CBIC em um relatório que identificou 10 janelas para a prática de corrupção. São brechas nas licitações ou contratos que aumentam as chances de agentes públicos e empresas cometerem atos ilícitos.
Para cada um dos riscos, a CBIC sugere uma solução. Confira:
A ausência de projetos completos pode dar margem a práticas de corrupção que se apoiam em orçamentos imprecisos. Os projetos acabam aprovados sem transparência e com base em critérios subjetivos.
Proposta: criar mecanismos que anulem as licitações iniciadas sem projetos completos de Engenharia (que incluem o planejamento da parte arquitetônica, a sondagem do solo, imagem do terreno com suas oscilações e especificações completas dos materiais), punindo os agentes públicos responsáveis.
A concentração de várias obras em uma mesma licitação faz com que apenas construtoras de grande porte tenham condições de participar das concorrências, reduzindo-as a um pequeno grupo de empresas.
Proposta: subdividir as licitações para democratizar a participação de mais construtoras. Além disso, o mecanismo legal proposto pela CBIC é dar mais transparência ao processo, seja em licitações agrupadas ou fracionadas. Isso pode ser feito pela divulgação, nos editais, das justificativas técnicas e econômicas que fundamentam o fracionamento – ou não – do projeto.
A CBIC também lembra das exigências excessivas para entrar em licitações, tanto na comprovação de experiência técnica quanto de capacidade financeira. Por exemplo: em uma concorrência para a construção de uma rodovia com 200 quilômetros, solicitar a exigência de a empresa já ter feito alguma outra via com a mesma medida. “Uma construtora que faz 100 quilômetros de estrada está perfeitamente apta a fazer mais do que isso”, explica Carlos Eduardo Lima Jorge, presidente da Comissão de Infraestrutura da CBIC.
Proposta: coibir imposições e requisitos excessivos em editais, com punição dos responsáveis quando acontecerem.
Hoje, os governos colocam em licitação obras e projetos sem licença ambiental. Depois que a empresa vence a concorrência, aí é que vai se tentar obter o documento. “Às vezes, as licenças apontam inclusive alterações no traçado dos projetos, atrasando as obras”, lembra Jorge. Isso gera risco de comprometimento da própria viabilidade do empreendimento e abre espaço para práticas antiéticas
Proposta: tornar a obtenção da licença ambiental prévia requisito para a publicação do edital e transformar a obtenção da licença ambiental de instalação em exigência obrigatória para a emissão da Ordem de Serviços.
A administração pública deve buscar sempre o melhor preço nas licitações. Hoje, essa determinação leva ao risco de não cumprimento de contratos. São inúmeros os casos de empresas que reduzem muito os valores das propostas com a expectativa de serem vencedoras e depois usar artifícios para ajustar os preços.
Proposta: nas propostas em que apareçam valores inferiores a 90% do preço de referência, exigir a apresentação de garantia complementar (um seguro oferecido por banco ou seguradora que avalize o valor inferior).
Não são poucos os casos em que o orçamento de referência tem como base um projeto incompleto. Os órgãos públicos também costumam fazê-lo para se ajustar à verba disponível, muitas vezes insuficiente. O resultado disso são os “ajustes” posteriores à licitação feitos de forma não transparente.
Proposta: criar mecanismo que responsabilize técnica, administrativa e civilmente o encarregado da elaboração dos orçamentos de referência.
O desequilíbrio entre o governante e a empreiteira sobre os direitos e responsabilidades gera um excessivo empoderamento do gestor público, que decide sobre questões que deveriam estar previamente definidas. “O agente público pode decidir questões que a lei não está deixando claras, penalizando uma empresa e não outra”, exemplifica Jorge.
Proposta: definir com clareza e previamente os direitos e as responsabilidades de contratantes e de contratados, com total equilíbrio.
Com o descumprimento dos contratos, abre-se espaço para subornos (com intenção de evitar punições) ou uso de artifícios irregulares na prestação de contas.
Proposta: acentuar as atividades dos órgãos de fiscalização com foco no cumprimento dos prazos de pagamento, respeito às especificações do projeto e existência de projeto completo. Hoje, os órgãos de fiscalização e controle concentram suas atividades na fase em que o contrato já está em execução, com 30% ou 40% da obra em andamento, segundo a CBIC. “Nosso pedido é para que os fiscais façam seus papéis de maneira antecipada, ainda na análise desse projeto na concorrência”, destaca Jorge.
A execução da obra deve seguir cronograma aprovado, mas, na prática, o ritmo está condicionado à situação dos cofres públicos. Deixar de pagar, atrasar ou pagar parcialmente são formas de equilibrar o caixa. Esse cenário pode induzir à busca de soluções privilegiadas para algumas empresas que ultrapassem limites éticos, como negociações feitas fora do contrato.
Proposta: garantir o fluxo regular de recursos ao longo da execução da obra. Se for comprovada necessidade de revisão da previsão inicial, a administração pública deverá emitir prévio aviso, negociando novo cronograma que leve em conta os custos.
Os pagamentos devem seguir rigorosamente a cronologia: a empresa que executou seu serviço primeiro tem direito a receber antes daquela que executou depois. Não respeitar essa ordem ajuda a estimular práticas ilícitas.
Proposta: tornar pública a ordem cronológica dos pagamentos, por órgão contratante e por fonte de receita.